Artigo – A Mediocridade como Norma e o Idiota da Aldeia – por Mário Benning.

Mário Flávio - 22.09.2015 às 13:51h

O adjetivo medíocre é o que melhor retrata a época em que estamos vivendo; estamos sob o signo da mediocridade. Embora ele seja erroneamente usado como sinônimo de ruim ou péssimo, o real sentido do termo medíocre seria: banal, comum, sem originalidade ou inexpressivo. Para Umberto Eco, historiador e romancista italiano, essa mediocrização da sociedade tem início com a eclosão das mídias de massa. Primeiramente com a televisão, e agora agravada exponencialmente com a internet, dominada pelas redes sociais; e que consolidaram a ditadura do homem medíocre.

Entronizamos a mediocridade como objetivo de vida, somos quase que forçados a nos enquadrar na ditadura da maioria, da opinião dominante e consolidada. Onde pensar diferente, ou questionar, é tratado como se fosse um sacrilégio ou uma ofensa.

Somos bombardeados por uma avalanche de informações e estímulos, nas mais diversas áreas: música, jornalismo, cinema e literatura. Produzidos numa velocidade assustadora, cuja única qualidade é serem pasteurizadas, homogeneizadas e sem profundidade alguma. Feitas para atender a tudo, e a todos os gostos. E que de tanto serem repetidas exaustivamente, maciçamente, são consideradas como verdades, ou de terem alguma qualidade.

Se o Iluminismo colocou como pedra angular o pensamento, como marca da existência humana, o famoso: Penso logo existo. O homem moderno vem sendo guiado por outro dístico: Assisto e replico, logo existo. Ao invés de superarmos os nossos limites, de rompermos os grilhões da ignorância, somos conclamados a aderir à banalidade e a mediocridade. Invertemos o sonho de Ícaro, não buscamos o sol; mas sim nos acomodamos na lama.

Entre o conhecimento, que requer leitura, reflexão e uma postura crítica, preferimos ter uma opinião. O que importa, nos tempos de hoje, é ter uma opinião e conquistar os cinco minutos de fama; mesmo que para se conseguir isso não se tenha feito nenhum esforço. Conseguir likes, expondo toda sorte de superficialidades, idiotices, violências e ignorância nas redes sociais, move o mundo.

A opinião atingiu status de conhecimento, e se essa opinião é referendada por uma gama de seguidores, mesmo que conhecimento formal a contradiga, ela alcança o nível de verdade absoluta. Mesmo que não tenha nenhum embasamento, o que vale é proferir: “Que está é a sua opinião.” Como se só isso bastava para transformar um erro em verdade. O problema é que opinião não é conhecimento!

Para Platão, o caminho para o ser humano atingir a plenitude passava por diversas etapas. Nessas etapas, teríamos que sair do domínio da opinião, dóxa, e atingíssemos o domínio do conhecimento, epistéme.

Para ele, a opinião é o conhecimento parcial, superficial, impreciso e medíocre. Já que a opinião é baseada em critérios individuais, subjetivos, não podendo assim ser usada como guia ético, ou norte moral. Ela é fundamentada sobre uma base frágil, que não suporta o julgamento da razão, induzindo ao erro aqueles que se guiam apenas por elas.

Só o conhecimento, epistéme, daria ao ser humano as bases necessárias para concretizar o bem comum. Todavia, esse estágio só seria atingido através da reflexão, da leitura e da racionalidade. Hoje temos mitos sendo tratados como verdades e qualquer afirmação encontrada em qualquer recanto da internet sendo usada como lastro argumentativo, mesmo sem ter qualquer comprovação.

No começo deste ano nos EUA, ocorreu um surto de sarampo o maior em quinze anos. Ao se investigar como uma doença, que foi erradicada, e que pode até matar, tinha voltado. Descobriu-se que muitos pais não tinham vacinados seus filhos por conta da difusão na internet de uma notícia relacionando a vacina contra o sarampo ao autismo.

Não há nenhuma pesquisa, nenhum resultado, nenhuma instituição ou publicação séria por traz dessa informação. As pessoas não checaram a procedência da informação, e comprometeram o trabalho de décadas de imunização.

Isso vem ocorrendo nas mais diversas áreas, com pessoas proferindo verdades sem nenhum dado que as valide. A única coisa que vale é ter opinião e defende-la com xingamentos quando faltar a argumentos. Comenta-se e julga-se tudo e todos: história, política, economia, direito e cultura, tendo somente a opinião como fonte. E o pior guiando a sociedade em suas encruzilhadas e conflitos.

Não queremos com isso soar preconceituosos, que somente quem possui um título acadêmico qualquer pode opinar, não é isso. Até porque um simples título, não transforma ninguém em sábio, e acumular cultura ou informação, não é sinônimo de inteligência ou bom senso.

Umberto Eco colocou que as liberdades de expressão e de opinião são: conquistas sociais e direitos; mas ao mesmo tempo uma responsabilidade coletiva. E que não deve estar a serviço de egocêntricos ou de interesses rasteiros, ou imediatos. Deve sim, estarem atreladas as responsabilidades ética e argumentativa. Do contrário traremos o idiota da aldeia, ou uma legião de imbecis, para o centro do debate, como portadores de verdade. Gente: “que antes só falava em um bar e depois de uma taça de vinho, sem prejudicar a coletividade

*Mário Benning é Mestre em Geografia e Professor do IFPE/Caruaru.