Como todos os anos anteriores, o período junino traz consigo uma discussão repetida que é um tratamento mais digno à cultura e os artistas locais. Seguem-se uma série de declarações em redes sociais e imprensa, entrevistas e depoimentos acalorados e reclamações reincidentes. A defesa da cultura até aparece mais no discurso de alguns vereadores do que nos candidatos majoritários. A cidade continua fervilhando com artistas que atuam com ou sem apoio governamental e de setores privados, os gestores até avançam com programas interessantes, porém acabam descontinuados e as boas intenções dos muitos fazedores de cultura acabam sendo tolhidas por limitações naturais ou impostas.
Em recente entrevista a Rádio Globo FM, num programa semanal apresentado pelo responsável por este blog, o vice-prefeito e pré-candidato Jorge Gomes (PSB) deu ênfase o tempo todo sobre o potencial de um Sistema, no caso o de Política Cultural, que começou sua construção no município desde 2015, ano da primeira Conferência de Cultura, porém só veio a ser levado a sério em 2013, 3ª Conferência Municipal de Cultura, e a partir daquele ano o processo acumulativo de plenárias e ações desembocou na Lei do Sistema em 2014, na reformulação do antigo Conselho de Cultura em Conselho Municipal de Política Cultural no ano passado e, este ano na criação do Fundo Municipal e do Plano Municipal de Política Cultural, fazendo com que possamos ter pela frente o que se chama POLÍTICA DE ESTADO e não apenas momentânea proposta por esta ou aquela gestão.
Ainda que pouco compreendido o pré-candidato, e todos os outros que assim o fizerem, acerta na leitura do diagnóstico e no tratamento sugerido, pois só a partir deste é que vem o prognóstico que traçará o resultado futuro.
Foi em sua primeira gestão à frente do Ministério da Cultura (MinC), entre 2008 e 2010, que Juca Ferreira buscou estabelecer um conjunto de políticas públicas para revitalizar a Fundação Nacional de Artes (Funarte), surgindo na seqüência o processo de construção da Política Nacional das Artes (PNA), cujo objetivo principal é a implementação de políticas públicas atualizadas, fundamentadas e duradouras para as artes. O Ministro formou um Comitê Executivo e que ao longo do processo está sistematizando e consolidação informações para a elaboração de políticas públicas consistentes e duradouras para as artes no âmbito nacional.
No âmbito municipal quem está vivendo o processo de dentro enxerga que nossos avanços tem se dado muito por conta da mobilização e força da sociedade civil, reclamando que setores governamentais pouco se movimentam. É um fato e é importante entender que isso leva a crer que a ação está se desdobrando de baixo para cima, com a organização e articulação de agentes e comunidades com pouca interferência dos ‘de cima’. É essa organização e atuação efetiva da sociedade que acaba impulsionando a presença do poder público com respostas a estas demandas. E, por outro lado, a gestão vai ser fomentadora é aquela que ouvir e enxergar estes problemas levantados em toda cadeia de criação, produção, difusão e consumo cultural e saber se posicionar se articulando com parceiros e intersetorialmente, até mesmo de parceiros como a secretaria de Participação Social e plenárias do Orçamento Participativo, nesta, sendo contemplado o Turismo Rural na Pedra do Cruzeiro (Vila Peladas).
Por isso não acho interessante desacreditar no diálogo, na construção coletiva, em plenárias e reuniões, etc. Pois é exercício de cidadania e tomada de decisões conjuntas, ainda que seja cansativo e muitas vezes desestimulante, mas é o caminho mais correto a trilhar, por isso a proposta de atiçar o desejo de outros horizontes viáveis. Entre as muitas demandas da 3ª Conferência tem a criação da Secretaria de Cultura, uma política de editais, projetos que apoiem viagens interestaduais e internacionais inclusive em forma de intercâmbios culturais. Há propostas desta Conferência que já foram contempladas de forma prática, como o Polo Cultural da Estação Ferroviária onde já funcionou em 2014 oficinas de circo e cine-clube e estão em vigor até hoje oficinas de perna-de-pau, mamulengo, malabarismo, violão, pífano, percussão, capoeira, etc. tendo pouco incentivo do governo, mas acontecendo. Atualmente neste local, além de restaurantes e bares que compõe a área gastronômica, tem a sede do Instituto Histórico de Caruaru (IHC), o Centro de Cultura Popular Mestre Gercino (Boi Tira-Teima), a Casa do Pife, Teatro-Garagem Mamusebá (Mamulengos), Casa dos Artistas e, em fase de instalação sede da Academia Caruaruense de Literatura de Cordel e Casa da Capoeira.
É evidente que é necessário o poder público apresente um projeto definitivo para o local. Outra iniciativa que vale lembrar foi o NAC (Núcleo de Ação Cultural) que foi paralisado, mas enquanto esteve ativo consistia na fomentação da cultura, de modo que a iniciativa pública se deslocava até os bairros e zona rural, primeiro identificando as demandas da localidade e traçando estratégias culturais para cada espaço, provendo depois a um custo baixo essa movimentação no local e empregando artistas dos segmentos. O NAC chegava a atingir 25 bairros por semana oferecendo oficinas gratuitas de teatro, dança, artes visuais (fotografia, cine clube e animação) fomentando a produção e absorção de arte em todo os bairros e zona rural. Em 2015 teve o Projeto Arte nas Praças que levava aos espaços públicos os serviços de arte e musicalidade que são oferecidos pelo Serviço de Convivência da Secretaria de Políticas Sociais, para crianças e adolescentes de 7 a 17 anos, assim levava-se às comunidades Orquestra de Metais, composta por instrumentos de sopro, banda de pífanos e apresentação de Hip-Hop.
A Casa de Cultura José Condé com oficinas de fotografia, computação, violão, teatro, dança (zumba), artesanato e moda. Entendo que o desafio de se fazer cumprir o que é demandado pelo Conselho é um desafio gigante, mas é fundamentalmente também uma questão cultural que precisa ser enfrentado e mudado. Precisamos continuar não desistindo desse propósito: unir artistas, setores artísticos e a sociedade em geral no sentido de impor a política para as artes como uma agenda fundamental na cidade. E que os políticos que querem sinceramente ver dias melhores para os artistas e para nossa cultura precisam ter um olhar mais sensível a esta agenda, pois queiram ou não queiram o avanço da ‘manada’ está se dando e os que ficarem no caminho correm o risco de serem atropelados.
*Paulo Nailson – É militante na Cultura