Percebam, uma Constituição não está para codificar exaustivamente o desenho institucional de um país. Pelo contrário, ela serve como ponto de partida e como ponto de limitação para as instituições formais e informais de um Estado.
Quando alguém fala em nova constituinte, como se isso fosse resolver os problemas enfrentados pelo Brasil, eu me pergunto se o desconhecimento da dinâmica das relações entre as instituições é por ingenuidade ou por maldade.
Existem fatores reais de poder que não podem ser desconsiderados e que têm profundas raízes históricas. Tentar essa artimanha é renascer nas instituições o Leito de Procusto e a chance de dar errado é gigantesca, pois da guerra entre as instituições formais e informais, estas últimas geralmente saem ganhando.
Lá em “Os Donos do Poder”, Raymundo Faoro tenta mapear, desde o início de Portugal, os sustentáculos da atual configuração política do nosso país, leitura obrigatória. Para entender um pouco dessa nossa configuração política Gilberto Freyre é outra fonte inestimável.
Por isso é tão perigoso que um candidato à presidência (ou seu vice) aponte a direção de uma Constituinte. Nada justifica essa violência institucional e, a não ser por um golpe, essa não é uma atribuição do Chefe do Executivo.
A Carta de 88 já vai com mais de 100 emendas, tem defeitos gravíssimos do ponto de vista jurídico e político, mas é o que temos para hoje. Há meios dentro do Estado Democrático de Direito para modificá-la e esses devem ser usados para atualizar o texto de 88, qualquer tentativa fora disso não só fere as regras do jogo como demonstra total desprezo pelas instituições.
Numa sociedade complexa como a nossa ninguém se torna dono da bola do jogo sem criar caos e autocracias.
De olho em candidato que fala de Constituinte, é cilada, bino.
*Paulo Fernando, é mestre em direito pela UFPE