Artigo – Crédito consignado avança sobre o FGTS – Por: Clóvis Santos*

Mário Flávio - 22.07.2016 às 10:01h

Somos severos críticos da legislação que permite ao aposentados e servidores públicos, de baixa renda, contrair empréstimos consignados, pois, os mesmos implicam em quase sempre em transformar um momento de aperto em anos de escravidão do desconto consignado, onde parte considerável do salário do trabalhador é retido para pagar as parcelas do empréstimo, e por brechas na lei, ou simples gana do sistema financeiro, alguns trabalhadores chegam a ter dois ou três descontos de crédito consignado em seus contracheques, em alguns casos extrapolando em muito o limite máximo de 35% previsto em Lei.

Se considerarmos, que com o salário integral, já é necessário malabarismo para cumprir as obrigações, com menos trinta e cinco por cento a conta passa a não fechar, privando o trabalhador de viveres e remédios essenciais a sua sobrevivência.

Com a Lei nº 13.313/016 (D.O.U 15/07/2016), o Congresso Nacional transformou, em Lei, a Medida Provisória nº 719/2016, e consolidou um absurdo maior ainda, permite a nova Lei, que o trabalhador não só comprometa seu salário atual, mas também o FGTS, que até então servia para dar alguma garantia ao trabalhador quando desempregado, ou cobrir situações muito graves câncer e HIV, danos de tragédias naturais como enchentes e desabamentos, além da compra de casa própria ou reforma, por exemplo.

A Lei nº 13.313/2016, que converteu a Medida Provisória Nº 719/2016, altera as Leis 10.820/2003, que trata da autorização para desconto de prestações em folha de pagamento, e outras, que não se relacionam com o assunto que estamos tratando.

Agora a Lei 10.820/2003, permite em seu que nas operações de crédito consignado, o empregado possa oferecer em garantia, de forma irrevogável e irretratável, até 10% (dez por cento) do saldo de sua conta vinculada no Fundo de Garantia do Tempo de Serviço – FGTS e até 100% (cem por cento) do valor da multa de 40% sobre o saldo do FGTS, que é paga pelo empregador, em caso de despedida sem justa causa, ou de despedida por culpa recíproca ou força maior, nos termos dos §§ 1º e 2º do art. 18 da Lei nº 8.036, de 11 de maio de 1990.

Vamos a um exemplo: Um trabalhador que tenha R$ 20.000,00 (vinte mil reais), no FGTS, quando da demissão, (sem justa causa), receberá esse valor mais a multa de 40%, (R$ 8.000,00 – oito mil reais), se der em garantia tudo que é permitido pela Lei, estaria comprometendo, 10% do saldo da conta (R$ 2 mil) e 100% do valor da multa (R$ 8 mil), assim, o banco receberia, dos R$ 28 mil, a garantia estabelecida em R$ 10 mil e o trabalhador R$ 18 mil, o que diminui sua sobrevida, com os recursos do FGTS, e pode comprometer seus planos futuros de investimento em outra atividade, pois, diminui-lhe o capital que teria disponível e que pode ter sido induzido, pela facilidade, a gastar em algo não tão necessário, como turismo e bens de consumo!

A Lei ainda diz que a garantia só poderá ser acionada na ocorrência de despedida sem justa causa, inclusive a indireta (quando a empresa é a culpada pelo fim do vínculo), ou de despedida por culpa recíproca ou força maior, deixando de fora apenas a justa causa e os casos de morte, onde não há multa ou liberação do FGTS!

A Lei em debate excepcionou o disposto no § 2º do art. 2º da Lei nº 8.036, de 11 de maio de 1990, que garante a impenhorabilidade da conta do FGTS, ou seja; o FGTS é impenhorável, a não ser para o sistema bancário.

A Lei deixou para o Conselho Curador do FGTS, definir os procedimentos operacionais e o número máximo de parcelas e taxa máxima mensal de juros a ser cobrada pelas instituições bancárias nas operações de crédito consignado com o FGTS como garantia, o que a nosso ver teria de ser uma taxa de juros muitíssimo baixa, pois, a operação quase não oferece risco ao banco.

Assim, embora em vigor, os empréstimos ainda não estão sendo liberados, nos termos da nova Lei, em virtude da falta de regulamentação do Conselho Curador do FGTS.

Na busca incansável de favorecer o capital, o Governo, mais uma vez, desestimula a poupança (mesmo a involuntária do FGTS) e, ainda cria mecanismos para transferir fundos (e juros) do FGTS para o sistema bancário, isso terá conseqüência malévolas em milhares de lares, no campo da vida privada; e também reflexos, no campo econômico nacional, pois, deixa mais desprotegido o trabalhador desempregado.

É a nossa opinião!

*Clóvis Santos – OAB/PE 28.633-D – É Advogado, pós graduado em Direito e Processo do Trabalho