Opinião – A Feira do Troca, trocando em miúdos – por Mário Benning*

Mário Flávio - 10.05.2013 às 16:15h

A recente polêmica com as mudanças patrocinadas pela Prefeitura na chamada Feira do Troca, tiveram como efeito literal a agitação de um vespeiro, com declarações ácidas contra a medida brotando dos mais diferentes segmentos: situação, oposição, classe artística e sociedade como um todo. Esse evento remete a outros ocorridos anteriormente na cidade, como a preservação do Pátio da Estação, ameaçado na gestão anterior e a derrubada da Vila do Forró.

O que fica patente com tais mobilizações, antigas e recentes, é o interesse dos caruaruenses em proteger os elementos que nos unem. Afinal Caruaru não é uma cidade ou uma sociedade apenas porque estamos próximos fisicamente ou ocupamos uma área comum, mas porque desenvolvemos um senso de comunidade. Um sentimento que é forjado lentamente ao longo da história ao compartilhamos experiências comuns, que nos singularizam, nos individualizam, no mundo cada vez mais homogêneo. É para manter essas heranças que existem os tombamentos dos patrimônios materiais e imateriais, pois são esses os elementos que aglutinam os indivíduos e os transformam em coletividade.

Desde os espaços e prédios públicos, os ritmos, a culinária, as demais artes ou os saberes populares, pois esses são consequência direta das nossas relações com o mundo à nossa volta. Testemunhas silenciosas de eventos históricos que nos ligam aos nossos antepassados, dando-nos assim um senso de continuidade. Com essas ações de proteção procuramos preservar as nossas raízes, para assim fortalecidos em nossa base possamos encarar, interpretar e interagir com um mundo cada vez mais globalizado, pois como disse Tostói: “Se queres ser universal, começa por pintar a tua aldeia.”.

Essa luta pela preservação tem vários ângulos e afeta diretamente diversos entes públicos: a sociedade e os diversos níveis de governo. Para a sociedade como um todo a manutenção da feira representa a preservação das práticas do comércio popular, apesar da maior parte da cidade não recorrer aos serviços da feira do troca, procuram preservá-la como um espaço de trocas não monetárias tão típicas do Nordeste. Bem como também de acesso a produtos antigos, que não são encontrados mais no comércio local cada vez mais padronizado e massificado.

Já em relação ao poder público, a medida de extinção da feira, depois transformada em revitalização é infelizmente, um atestado do fracasso das nossas políticas de segurança, inclusão social e de gestão dos espaços públicos, desenvolvidas tanto pela União, Governo Estadual e pela Prefeitura. Nas esferas da União e do Governo Estadual, a conversão da Feira do Troca em espaço para tráfico de drogas ou comércio de produtos roubados, expõem a incapacidade desses agentes em proteger as nossas fronteiras do contrabando de drogas, armas ou desenvolver políticas de segurança que atuem além da repressão, mas que contemplem também a prevenção e a ressocialização.

E desde já as mudanças na feira se revelarão inócuas, pois alguém duvida que o tráfico de drogas ou o comércio de armas migrarão para outros espaços onde o poder público não atue de maneira eficaz? Algum gueto de nossa periferia abandonada secularmente. Achar que com tais medidas tornarão Caruaru mais segura é tratar superficial e midiaticamente uma questão que exige: planejamento, seriedade e continuidade. Não devemos tomar decisões passionais e unilaterais.
No que tange a esfera local esse fato evoca duas grandes máculas que afetam a este governo. A primeira a questão da falta de diálogo e de democracia, que periodicamente afloram numa gestão que busca, pelo menos na teoria, ter uma participação social maior, mas que na prática tem suas decisões eivadas pelo ranço do autoritarismo.

A segunda é a demora em se tomar uma decisão efetiva em relação ao Pátio da Sulanca, afinal infelizmente o atual espaço da feira só é usado com a finalidade correta apenas nos dias de feira. Nos demais dias tornou-se um quisto maligno e um antro para a criminalidade. Afetando hoje principalmente a Feira do Troca, mas que tal como um câncer se espalhará para as demais feiras praticadas no Parque 18 de Maio. Nesse momento em relação ao espaço do Parque não cabem mais remendos, paliativos ou adiamentos, mas sim uma solução efetiva, pois não se põem remendo novo em pano velho.

A polêmica a respeito da Feira do Troca não envolve apenas os danos ao imaginário local ou a nossa identidade cultural, mas revelam a necessidade de se abordarem as questões sociais não apenas como caso de polícia, mas sim discutindo e repensando o tipo de sociedade em que vivemos e em qual queremos viver. E que políticas públicas são necessárias a essa transformação, pois nesse momento estamos necessitando que os nossos governantes tomem a dianteira nas questões relativas à segurança pública, que ajam e que não apenas sigam a reboque, somente reagindo ao avanço da criminalidade.

* Mário Benning é professor e analista político