É mais comum que a morte marque a história dos revolucionários, dos grandes artistas ou dos líderes mundiais como sendo o momento em que o homem se transforma em mito, ou seja, a passagem de uma trajetória real que, de tão real passa a ser lendária. Mandela não foi um desses casos em que a morte imortaliza, tornou-se mito ainda em vida. Os anos de prisão não cercearam sua luta e sua atividade militante. Mesmo numa clausura conseguia ser foco de resistência inteligente contrário a toda estrutura opressora da África de regime segregacionista.
A linha do tempo de Nelson Mandela constitui-se numa das histórias mais transformadoras do século XX, com destaque para os longos anos de cativeiro, o período de militância que o antecedeu e a ascensão política após sua liberdade na década de 1990, que foram também os anos de reconhecimento do seu papel no cenário internacional com o Prêmio Nobel da Paz de 1993.
Como presidente da África do Sul conseguiu corrigir um erro histórico pois, sustentava a bandeira da igualdade de direitos e, com isso, superava perspectivas equivocadas que hierarquizavam a raça humana e serviram de “justificativa” para o imperialismo europeu no continente africano.
Importantes lições podem ser aprendidas a partir do exemplo de Nelson Mandela, seja nas estratégias de política conciliadora, seja no carisma como elemento agregador, ou mesmo nos seus anos de intenso ativismo político marcado pela desobediência civil, sabotagens e luta armada. Esta última mais distante da ideia que se tem de um Nobel da Paz porém, não menos importante na composição de tudo aquilo que Mandela foi e representa.
Nesse ponto países como o Brasil parecem não ter aprendido a lição.
O Estado brasileiro demonstra não compreender que as desigualdades sociais geram protestos e mobilizações de rua e, estabelecido o conflito, o que deve ser sanado são as desigualdades e não as manifestações em si. Criminalizar os que lutam por direitos é mais fácil do que assegurar dignidade e emancipar os oprimidos. No Brasil, a morte do líder negro escancara mais essa contradição: o país que homenageia o Mandela Nobel da Paz é o mesmo que taxaria como vândalo o Mandela líder comunista, o prenderia novamente e o jogaria numa cela, desta vez superlotada.
*Fabiano Andrade é professor