Entre as 19h de domingo (02) e as 13h desta terça (04), foram registradas no Twitter mais de 2,5 milhões de menções ao incêndio que atingiu o Museu Nacional no último fim de semana. Após o grande pico de menções sobre o assunto, verificado na noite de domingo, a discussão continua, porém em tendência de queda. A utilização de recursos públicos para a área cultural é a narrativa que norteia o debate, que, além da responsabilização do governo pela tragédia, também inclui os nomes dos candidatos que disputam a Presidência. A hashtag #lutomuseunacional foi a mais utilizada, aparecendo em 5,3% das publicações. Em seguida, destacaram-se as tags #museunacional (2,7%) e #lutopelamemoria (0,3%).
Entre os presidenciáveis, Jair Bolsonaro é o que mais aparece associado à tragédia do Museu Nacional. O incêndio é utilizado como argumento por usuários contrários ao candidato, que o acusam de ter apoiado a PEC do Teto e de anunciar que acabará com o Ministério da Cultura. Por outro lado, simpatizantes do candidato respondem às acusações com publicações irônicas, em que questionam a “culpabilização” de Bolsonaro e a não responsabilização da reitoria da UFRJ e dos governos do PT e do PMDB.
Os cortes de recursos para a cultura aparecem também em relação aos governos do ex-presidente Lula, segundo candidato mais citado, novamente de modo bastante polarizado. Algumas das postagens mais retuitadas comparam o petista e Michel Temer, apontando que, apesar da falta de educação formal do primeiro, ele teria investido mais nos museus brasileiros. Há também, em contrapartida, menções que destacam a importância de olhar a tragédia do Museu Nacional em perspectiva histórica, atribuindo responsabilidade também aos governos petistas. Grande parte das publicações critica, ainda, a destinação de recursos da Lei Rouanet pelo candidato durante sua gestão – recursos que, segundo tais usuários, poderiam ter sido aplicados na manutenção de instituições culturais.
Em terceiro lugar, Geraldo Alckmin é citado também como “apoiador” da PEC do Teto, em referências que apontam a medida como uma das causas da carência de recursos para o museu.
Destaca-se, no entanto, uma narrativa que relaciona a gestão do tucano em São Paulo ao incêndio do Museu da Língua Portuguesa e ao fechamento do Museu do Ipiranga. A publicação do perfil oficial do candidato sobre a tragédia também foi bastante retuitada no período analisado.
João Amoêdo é criticado por supostamente não trazer medidas em seu plano de governo voltadas para a cultura, diferentemente, segundo tais usuários, de Marina Silva e Lula, e por ser visto como um candidato que apoia cortes de gastos públicos. Outros perfis, no entanto, elogiam o candidato por ter “denunciado” em uma sabatina recente o descaso com o patrimônio histórico nacional.
Guilherme Boulos, quinto candidato mais citado em associação ao incêndio, foi bastante criticado, em função das acusações publicadas por seu perfil oficial contra Michel Temer. A crítica se amplificou, especialmente, a partir da discussão entre o candidato e o apresentador Marcelo Tas sobre a responsabilidade da falta de recursos.
A principal narrativa sobre o incêndio, no Twitter, envolve a utilização de recursos públicos para a área cultural. Trava-se, neste cenário, uma disputa pela falta de verbas supostamente associada à destruição do museu. Assim, há reclamações sobre a destinação de verbas por governos anteriores — com a Lei Rouanet aparecendo em 57,8 mil menções —; críticas à Emenda Constitucional 95 (ainda chamada de PEC do Teto), presente em 31,6 mil postagens; e questionamentos sobre a prioridade dos gastos que relacionam o custo de obras para a Copa e a Olimpíada do Rio e o valor necessário para a manutenção do Museu Nacional, entre outros temas.
Michel Temer aparece em 86,8 mil publicações, em que predominam reclamações sobre sua gestão. No entanto, também há também postagens que o defendem, afirmando que não se trata de um único governo culpado, mas de um histórico de descaso de décadas.
Pouco mais de 119 mil publicações sobre o incêndio o associam diretamente à Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), ora ressaltando a situação de “penúria” da instituição, que estaria sofrendo com repasses reduzidos e congelamentos, ora responsabilizando-a pelo problema. Aproximadamente 48% das postagens citam o reitor da instituição, Roberto Leher. Predominam entre estas menções a afirmação de que o reitor seria ligado ao PSOL — e que, portanto, o partido teria responsabilidade pela tragédia.
Menções sobre o modelo de gestão do museu destacam a possibilidade de surgimento de um discurso de privatização (22,8 mil postagens), que divide opiniões entre os usuários, e uma comparação com modelos de gestão de instituições internacionais. Os museus estrangeiros, citados quase 24 mil vezes, também mobilizaram referências à importância de responsabilização da população, questionando por quê os brasileiros não têm o hábito de fazer doações para instituições culturais.
Desinformação
Com o incêndio do museu, o debate sobre o uso de recursos públicos e o incentivo à cultura também tem sido alvo de desinformação. A Agência Lupa, parceira da FGV DAPP na Sala de Democracia Digital – #observa2018, checou as informações de uma corrente de WhatsApp sobre valores arrecadados por projetos na Lei Rouanet. Dos 14 projetos mencionados na corrente, que realmente citava propostas autorizadas pelo MinC para captar recursos junto aos chamados incentivadores culturais, oito jamais conseguiram arrecadar verba alguma.
A Agência Lupa também checou uma lista que tem circulado nas redes sociais desde domingo com alguns itens históricos que estariam no Museu Nacional e verificou que o museu “não abrigava nenhum dos 10 artefatos mencionados pelos sites analisados e nos posts que acabaram reproduzindo conteúdo semelhante e viralizaram no Facebook”.