Geraldo Júlio: “Estamos fazendo muitas ações com pouco dinheiro”

Mário Flávio - 03.02.2013 às 11:02h

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Entrevista publicada na Folha de PE

Enfatizando o volume de ações realizadas no primeiro mês de gestão, o prefeito do Recife, Geraldo Julio (PSB), faz questão de ressaltar que apresentou “feitos concretos” e não fez apenas jogo de cena para a sociedade. Mesmo assim, o gestor aponta que tirar do papel as primeiras benfeitorias não tem sido uma tarefa fácil, devido ao caixa apertado da gestão. No balanço da administração anterior, divulgado no Diário Oficial na última quarta-feira, o socialista comprovou que os investimentos feitos anteriormente ainda são baixos para as necessidades da cidade e que é preciso cortar gastos e ampliar os investimentos. Apesar da situação deixada pelo ex-prefeito João da Costa (PT) não ser muito animadora, Geraldo prefere não polemizar com o seu antecessor e garante que pretende apenas olhar para a frente. Nesta entrevista, concedida à Folha de Pernambuco, em visita à redação na última sexta-feira, o gestor defende uma nova divisão dos recursos do Governo Federal, detalha os futuros investimentos da cidade e reitera que cumprirá os quatro anos de mandato.

Qual o balanço que o senhor faz do primeiro mês de governo?
Um mês de muito trabalho e dedicação voltado para o nosso programa de governo. O Hospital da Mulher, as Upinhas, ações nas escolas, limpeza da cidade, o Compaz. Todas essas ações estão vinculadas ao nosso programa de governo. Foi um mês de muito trabalho, com o ritmo de trabalho do nosso governo. Com muito entusiasmo, muita animação e participação popular. A campanha “Eu amo o Recife” chegou em uma hora positiva porque todo mundo quer ajudar a cidade a ter mais qualidade de vida e isso depende da participação da população.

Não estava tendo essa participação?
Eu não vou olhar para trás. O povo quer ver a gente trabalhando e fazendo as ações que são importantes para a cidade. Foram 29 agendas de rua, somente nesses 30 dias.

O volume de trabalho inicial não será reduzido?
Não. O ritmo de trabalho é este. Ritmo de trabalho e realização. Se você observar nossas agendas de rua vai ver que não são visitas, são ações concretas. No primeiro dia de trabalho, apresentamos o Hospital da Mulher com o terreno onde ele será construído. Quando fomos ao Compaz é porque tínhamos o terreno. Quando anunciei as Upinhas, eu já disse onde elas seriam construídas. Quando fui no canal do Arruda é porque já estava fazendo a limpeza. A ação tapa-buracos na cidade é muito intensa, fizemos o recapeamento da Ernesto de Paula Santos e da Rui Barbosa.

Então, dinheiro tinha em caixa?
Na verdade, estamos fazendo muitas ações com pouco dinheiro. Na Policlínica Arnaldo Marques, a gente identificou alguns problemas e demos uma ordem de serviço de R$ 28 mil. E o que aconteceu com a policlínica, na maternidade ganhou mais quatro leitos. Eram 36, agora são 40. Com R$ 28 mil, ela se estruturou.

Este tipo de solução de gestão é o que tem de ser feito também em questões de administração maiores da cidade. A receita da Prefeitura do Recife do ano passado foi bem menor do que o previsto, esta é uma forma de melhorar a receita da gestão?
Claro que eu sei que não é possível que a cada R$ 28 mil gastos abrir dez mil novos atendimentos, mas foi uma oportunidade de prestar mais serviços à população com pouco dinheiro. Tudo que tiver desse jeito, nós vamos querer identificar. Mas tem muita coisa que queremos fazer que vão demandar muito dinheiro e, para fazer isso, é preciso aumentar a receita, otimizar gastos e captar mais recursos. É por isso que a gente foi a Brasília e se reuniu com a presidente Dilma (Rousseff). Me comprometi com ela a fazer uma avaliação precisa das obras do PAC no Recife, para que a gente possa acelerar o andamento dessa obras. Tive a felicidade de fazer um grande acordo com ela, que foi apoio do financiamento com a Caixa Econômica para fazer as contrapartidas da Prefeitura, porque o caixa está muito pressionado e a gente não tem dinheiro para fazer as contrapartidas de todas as obras do PAC. E ela me garantiu uma fonte especifica da Caixa.

O que o senhor encontrou em caixa foi diferente do que disseram na transição?
Eles não me disseram. Estamos esperando a execução orçamentária acabar, e ela só acaba mesmo no fim de dezembro. A contabilidade continua sendo feita e o relatório está publicado. A construção do quadro que você vê lá é de cerca de R$ 106 bilhões a pagar e um saldo de R$ 112 milhões. A realidade de recursos no Recife é esta. Se você somar isso com SUS e Fundeb, dá zero a zero o que tinha a pagar e o que tinha na conta.

Este valor de receita de capital em torno de R$ 200 milhões e de investimento próprio da Prefeitura em torno de R$ 300 milhões é o suficiente?
É um valor insuficiente para a cidade. Os últimos dez ou 15 anos mostram que o crescimento do Nordeste está criando um impacto no Recife que exige um volume de investimentos maior do que a cidade conseguiu fazer nestes últimos anos. O investimento na Casa de R$ 200 milhões que é o que a Prefeitura vem fazendo é insuficiente para os impactos que a cidade vem recebendo com o desenvolvimento. O investimento no ano passado foi em torno de R$ 300 milhões e a Via Mangue, por exemplo, custou R$ 100 milhões. Destes R$ 200 milhões, R$ 100 milhões é só da Via Mangue. Em relação a todos os outros investimentos dá em torno de 200. É pouco. A cidade a gente vê que está precisando de mais investimentos em pavimentação, drenagem, canais cuidados, habitação, escola, atendimento à saúde. Precisando de tudo isso é porque a cidade precisava ter investido mais. E vamos fazer isso captando mais recursos, racionando despesas, melhorando receita. Isso nós já estamos fazendo.

Faltou projetos para atrair investimentos?
A Prefeitura tem projetos sim, mas a gente precisava que existissem mais. Não é só Recife. A situação é a mesma no Brasil inteiro. O Governo Federal tem incentivado a criação de projetos. A gente também precisa ampliar a capacidade de realização porque fazer obra não é fácil. Às vezes, você pode ter dinheiro e não consegue fazer as obras. A gente ainda não estabeleceu a meta de captação de recursos, porque, quando fiz a reunião do secretariado, definimos que janeiro seria um mês de levantamento de informações, formação de equipe, estruturação das secretarias. O mês de fevereiro seria para aprofundar o que está em andamento como projetos, contratos e a vinculação disso ao nosso programa de governo. E, em março, teremos a pactuação.

O trabalho de otimização de gastos da Prefeitura do Recife já teve início?
A Controladoria já começou esse trabalho, mas vamos ter o apoio também do Movimento Brasil Competitivo, que deve estar começando a enviar suas equipes em março. Mas a Controladoria já começou essa análise toda dos principais itens de despesas, dos contratos em vigor. Estamos fazendo já a análise junto com a Secretaria de Assuntos Jurídicos para ver o que já conseguimos mudar imediatamente. Em março, terei a meta de corte por área, quanto vou cortar em locação e o tipo de despesa.

Existem alguns contratos em vigor na Prefeitura que foram alvos de polêmicas como os de coleta de lixo e merenda escolar. Quando vai ser iniciado o trabalho de revisão de contratos?
Baixei um decreto dizendo que só ia prorrogar os atuais contratos a partir de abril. Todos eles, para ver se, até abril, temos o diagnóstico dos principais para começar a tomar providências e tem mais vantagem para o município tanto de qualidade quanto de preço.

Como vai ser a preparação para apresentar um Recife diferente para a Copa das Confederações no mês de junho?
Assim como ela vem sendo. Já retiramos 25 mil toneladas de entulho da cidade somente neste mês e vou continuar tirando. Nós vamos fazer como fizemos em janeiro, continuar trabalhando muito, botar a equipe para trabalhar, contar com o apoio da Imprensa para entusiasmar a cidade e trazer todos para ajudar porque assim conseguimos uma cidade melhor. Tudo o que é possível fazer em cinco meses, vamos fazer. Nós já limpamos o correspondente ao dobro de limpeza de canaletas que se faz em um mês. Agora, tem obras de drenagem e infraestrutura que exigem um projeto executivo e licitação, que demandam tem­po. Eu não vou poder fazer um projeto de licitação e obra em tão pouco tempo, porque não é viável. Mas vamos continuar fazendo o trabalho intenso que estamos fazendo. Desde o início do ano, começamos a limpeza dos canais e dos parques porque a gente sabia que isso é uma coisa que tradicionalmente se faz em seis meses. Como a Copa das Confederações acontece com cinco meses e poucas semanas, antecipamos esse trabalho, demos uma puxada, mudamos o ritmo com a empresa que fazia o serviço, fizemos um plano de ataque diferente para as empresas poderem se antecipar. Demos uma ordem de serviço no Parque da Jaqueira, no Treze de Maio, já mexemos no entorno de alguns mercados da cidade.

O senhor está passando pela ameaça da primeira crise de governo com a negociação para implantar as aulas atividades na rede municipal. Já tem algum plano para implantar isso?
Eu não tive condição de fazer em 28 dias. Porque, na verdade, a legislação diz que é para ser um terço, não foi regulamentada. O Conselho Nacional de Educação diz que essa lei deve ser implementada de maneira paulatina, porque não foi regulamentado como fica um terço dessas atividades, quais atividades estão previstas. A gente tem 230 escolas e cinco mil professores. Você não pode, num passe de mágica, implantar isso, não. A conta que nós fizemos diz que os meninos iam ficar com quatro dias de aula. Não conheço uma escola que tenha quatro dias de aula, não conheço um pai e uma mãe que queiram ver seus filhos com quatro dias de aula. Sabendo disso, chamamos o sindicato para conversar. O secretário de Educação, Walmar Correia, teve quatro reuniões com o sindicato e eu tenho disposição de fazer isso. E vamos ter a condição de implantar essas aulas e fazer o diagnóstico completo e as contratações necessárias para fazer isso. Com o tempo que tínhamos não tínhamos condições e estamos discutindo com o sindicato, e queremos fazer essa implantação, mas não podemos deixar os meninos sem um dia de aula.

Uma das marcas da sua campanha eleitoral é que o senhor só sai quando o serviço termina. Tem trabalhado quantas horas na Prefeitura?
Tenho trabalhado até aproximadamente meia-noite.

Com o possível afastamento do governador Edu­ardo Campos para se candidatar à Presidência da República, o senhor deixaria a gestão se recebesse o convite?
Vou ficar no meu mandato e cumprir os quatro anos.

Os prefeitos estão reclamando muito porque, no Nordeste, muitos dependem do repasse do FPM. O senhor considera as medidas anunciadas pela presidente suficientes?
Quando a Constituição foi aprovada em 1988, as receitas que a União arrecadava e dividia entre Estados e municípios representava 75%. Hoje, a Constituição não mudou, mas o crescimento dos itens de receita da União mudou muito e, hoje, a União só repassa 45%. Isso é uma mudança muito expressiva. Isso significa que a grande maioria dos municípios está sem condição de fazer investimentos. O município luta para fazer a manutenção e pagar a folha e não resta nada para investimentos. Hoje a Prefeitura luta para conseguir investimentos da União. Esta é uma situação que deve ser discutida e analisada. Temos que fazer uma discussão sobre o novo pacto federativo para que os municípios voltem a fazer investimentos com sua receita.

Essa repactuação deve ser feita de forma isolada ou pela reforma tributária?
Eu acho que pode ser feita pela reforma tributária ou por outras formas também. Por exemplo, os royalties do petróleo podem ser discutidos. O salário educação, que é um imposto que é pago pelas empresas na sede das empresas, por exemplo, uma empresa que tem uma sede em São Paulo vai pagar seus tributos em São Paulo e eles ficam em uma das regiões mais ricas do País. Então, todas as oportunidades que houverem para descentralizar esses recursos, tanto a União como Estados e municípios devem fazer essa divisão melhor. Pode ser pela reforma tributária ou ações concretas como a questão dos royalties.

E compensações diretas para a redução do IPI?
Esta é uma discussão mais complexa, mas que já está sendo tratada pelos prefeitos com o Governo Federal. Existem outras formas, além dos royalties, que podem ser feitas. Os juros cobrados nas dívidas dos municípios. Existem vários instrumentos que podem ser objetos de discussão.