Opinião – “Dai a Seba o que é de Seba” – por Paulo Nailson

Mário Flávio - 13.12.2014 às 09:44h

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Foi mais uma viagem maravilhosa, embora tirando meus cochilos, mas sempre atento a prosa de Sebá com o motorista (Beto). E, chegando na FUNDARPE houve um imprevisto no exato momento de sua inscrição que o deixava desmotivado para o prêmio.
No ano passado, quando estávamos apresentando a inscrição, era 18 de outubro, ele quase desmoronou completamente. Exatamente na hora da conferência dos documentos, o telefone toca, era Luciana (esposa atual) comunicando a Sebá o falecimento de Vital Santos. No dia seguinte logo cedinho estávamos novamente juntos, desta vez com a CIA Feira de Teatro Popular, a caminho do Parque das Flores, em Tejipió. O velho-menino aguentava mais uma com uma força fora do comum. E, naquele ano, pela quinta vez ele não ganhara o reconhecimento do Prêmio Patrimônio Vivo.

Não sei até hoje onde ele encontra tanta resistência, aliás, sei, pois eu perguntei e ele me respondeu prontamente: vontade de viver! Natural de Sertânia, Sebá saiu de lá ainda com 3 anos. Seu avô, Pai velho, era Mamulengueiro. Seu tio, Arnóbio, palhaço. Então ele tem nas veias o sangue de artista e no coração muita garra para persistir. Começou a trabalhar aos 9 anos para ajudar no sustento. Entregava pão. Aos 12 anos chegou em Caruaru mas não foi desta vez ainda que permaneceu. Entre idas e vindas se fixou aqui a partir dos 15 anos.

Seu primeiro trabalho aqui foi num fiteiro de cigarro, em frente a pensão onde atualmente é a Panificadora Continental. Morava na pensão com seu irmão. Seu primeiro emprego formal foi na FENESA (Fios Elásticos do Nordeste S/A) empresa conveniada com a SUDENE, isso aos 16 anos. Aos 18 foi para o Rio de Janeiro e Trabalhou lá como Marteleiro. No período em que esteve lá, teve oportunidade de assistir o show de Frank Sinatra e conhecer Pelé. Conheceu nesta fase todos os pontos turísticos e tradicionais, mas tinha muita vontade de conhecer a praça General Osório (Ipanema), queria ver se era verdade o que diziam sobre os artistas que se apresentavam publicamente foi atropelado por uma ambulância. Quebrou clavícula, bacia e ficou muito machucado, talvez nem andasse mais…

Em Caruaru, veio a trabalhar em locais como na Estudantil, SANORTE, Souza Luna, etc. Considera-se artista desde criança, pois tudo que fazia era com arte, bem feito. Na viagem lembramos que uma de suas brincadeiras de criança preferida era brincar de “Chefe de índio”, ele preparava artesanalmente uma armadilha e fazia seus coleguinhas ‘cair na toca do índio’… (risos). Mas houve um momento em que ficamos sério até Ver seus olhos marejarem. Sua mãe o chamava de Sebinha e seu sonho era comprar uma casa para ela. Um dia, quando estava no Rio de Janeiro recebeu uma cartinha dela que dizia: “Filho, juntei dinheiro e comprei uma geladeira para você tomar água gelada”. Ele voltou imediatamente.
Sebá me contou que foi em Ponta Grossa (Curitiba), em 1980, num festival de teatro, quando fazia o personagem Elisbão (não tinha fala). Sua atuação foi tão destacada que na comissão julgadora tinha uma francesa que ficou encantada com as expressões que usava, perguntando: “Onde esse menino aprendeu tanta expressão corporal?” a partir deste momento percebeu o potencial que tinha para atuar.

Depois, no espetáculo “A noite do Tambor Silencioso”, peça que fala sobre o golpe de 64, começou a atuar com bonecos/Mamulengos. Vindo a surgir o Benedito. Há 13 anos no rádio tocando o autêntico forró e mantendo diariamente o universo do Mamusebá ele ainda tem projeto para realizar: “quero um dia ainda ver funcionando a Escola da família de Caruaru (para crianças)” me conta entusiasmado. Eu achei que ele já havia realizado tudo… Como bons companheiros de estrada, ao longo do caminho paramos para uma refeição e voltei a conversar então eu perguntei “com tanta coisa já feita na vida, você ainda consegue pensar no futuro?” e ele sentencia; “a estrada começa agora!”

Mas entre muitas coisas que conversamos entrou a política para ele ela é boa quando trabalha pelo povo e dá condições ao povo de sobreviver de modo digno. Mas lamenta os que se aproveitam do cargo público para se aproveitar para o bem pessoal. E aos amigos mais próximo aconselha: “se afaste da política partidária”!

Por último, conversamos sobre sua atuação na Paixão de Cristo desde 1997, e no clima da Paixão ele soltou essa… “não gosto de usar o nome santo em vão, eu tenho o maior cuidado com isso.” Aí eu perguntei sobre Deus… ele virou pra mim e disse:
– “ele é o comandante da humanidade. Nada acontece sem a permissão d’Ele. É através de Jesus que vamos ao Pai, mas os soberbos com ele não tem vez.”

Chegamos a cidade que é, talvez, a mais abençoada por Deus em talentos artísticos. nos despedimos com abraços e palavras de apreciação. Tentei fazer ele acreditar que o Patrimônio Vivo ainda estava à tempo pois na próxima semana vamos prosseguir com a inscrição.

Ele não acredita mais. Com desgosto e tristeza disse que sente-se premiado à altura por seu povo e seu município.
Honrado pelo seu povo e por seus companheiros, reconhecido pelo legislativo com a Medalha Onildo Almeida, ele que venceu tantas contradições da vida, superou e venceu enfermidades, acidentes, perdas e o câncer, bem que merecia do Governo do Estado o reconhecimento concedendo o “direito de preservar seus múltiplos saberes, fazeres, memórias e histórias,” ainda que tardio.

Eu prefiro acreditar na sensibilidade da comissão julgadora em premiá-lo ainda em vida: à Seba o que é de Seba!