Opinião – Mestre Dila, o Marechal dos Cordelistas – por Jénerson Alves*

Mário Flávio - 17.09.2019 às 16:39h

Há casos raros na literatura, em que autor e obra se confundem. Mestre Dila é um deles. Da sua pena, brotaram personagens, narrativas, imagens. Realidade e ficção se fundem na sua obra. Então, não é por acaso que há certos tons ficcionais em sua biografia. Alguns historiadores registram que o nascimento dele ocorreu no dia 23 de setembro de 1937. Entretanto, a família atesta que é no dia 17 de setembro que ele completa aniversário. Hoje, ele completa 82 anos de idade, morando em Caruaru desde os 15.

Seu legado para a literatura de cordel é inegável. Além da produção poética, seu manejo para criar xilogravuras é reconhecido mundialmente. Ademais, foi o introdutor da linogravura (desenhos feitos com borracha vulcanizada) na literatura de cordel. Desta forma, os traços das capas lavradas por Dila apresentam detalhes e contornos que, embora mantenham a rusticidade característica do folheto nordestino, configuram-se em novas expressões, formatando um diálogo entre o conteúdo poético, no interior, e o imagético, no exterior. 

A versatilidade de sua verve também se apresenta na multiplicidade de suas assinaturas. Dila, Dillas, Kirbaano Sabóia, José Soares da Silva (seu nome de batismo, inclusive) e Dila Soares da Silva são apenas algumas das formas utilizadas por ele em seus livretos.

Em 2005, foi considerado Patrimônio Vivo – título outorgado pela Secretaria Estadual de Cultura (Fundarpe). Humildemente, ele afirma que não se sente merecedor desta honraria. Assim como não adota o epíteto de Mestre, argumentando que “Mestre é Jesus”.

Da mesma geração de vates como Olegário Fernandes, José Pacheco, Vicente Vitorino, Jota Borges e Francisco Sales Arêda, Dila foi um dos responsáveis pela difusão da literatura de cordel pelo Nordeste. Alinhando o fazer artístico às demandas do mercado, conseguiu transformar versos em pão, sustentando a família.

Foi a partir do esforço de nomes como Mestre Dila que o Cordel alcançou posição de relevância no âmbito cultural. A criação da Academia Caruaruense de Literatura de Cordel (ACLC) é um dos frutos das sementes lançadas por Dila. Jovens escritores, como Espingarda do Cordel, Davi Geffson, Thais Avelino, Hugo Delleon e Jefferson Moisés – para citar apenas alguns – seguem os passos destes ícones, preservando a tradição com toques de modernidade. 

Atualmente, a Literatura de Cordel é reconhecida como Patrimônio Imaterial Brasileiro pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan). Há mais de 10 anos, funciona na rede municipal de Caruaru o projeto Cordel nas Escolas. Na Paraíba e em Pernambuco, tramitam projetos de lei que fomentam esta arte nas unidades educacionais – o primeiro, de autoria da deputada Pollyana Dutra; o segundo, do deputado Delegado Erick Lessa. Ademais, o Cordelista é reconhecido como profissional, segundo a Lei Federal 12.198/2010.

Estas conquistas da categoria só foram possíveis graças ao esforço de referências como Dila. No primeiro semestre, foi inaugurado o Memorial Mestre Dila, na Rua Antonio Satu, no Centro de Caruaru, organizado pelo artista Valdez Soares (filho de Dila), um local onde é possível aprender mais sobre a vida e obra do Mestre. Aplaudir o passado, o trabalho e a sua história é prenunciar a preservação da literatura de cordel como elemento identitário do nosso povo, aguando as raízes culturais da nossa ancestralidade. Parabéns, Mestre Dila!

*Jénerson Alves é jornalista e vice-presidente da Academia Caruaruense de Literatura de Cordel