Na semana que passou Caruaru foi palco de debates acalorados por conta da votação do aumento dos subsídios dos vereadores, prefeito, vice-prefeito e secretários da administração municipal. Os aumentos, que chegariam a 50%, geraram revolta na população e levantou uma antiga discussão: qual o salário justo para aquele que exerce uma função pública? A resposta, evidentemente, está ligada à forma como cada um encara a ocupação de um cargo público. Ainda que existam argumentos no sentido de que o valor dos subsídios dos agentes políticos corresponde a uma porcentagem ínfima da dotação anual, o debate sobre o valor líquido efetivo dessa retribuição pecuniária é uma ponderação inevitável.
Assim, refletindo sobre o assunto, podemos apontar, numa visão geral, duas formas de encarar o tema. Existem, por exemplo, aqueles que enxergam a atividade política como um ônus pelo qual devem ser remunerados. Esses destacam os desgastes, os encargos e uma teórica responsabilidade que acompanham a atividade do administrador público como fatores justificadores de uma remuneração substancial.
Dentre os que pensam dessa forma é comum encontrar aqueles que veem na ocupação de um cargo público uma oportunidade de alavancagem patrimonial. Esses fazem da política uma profissão cujo sucesso, assim como as outras no mercado capitalista, será daqueles que “aniquilarem” a concorrência e dominarem o seu ramo de atuação.
Pensando assim, a política deve remunerar sempre mais e melhor os que dela se ocupam, premiando os exitosos com patrimônios vultuosos semelhantes à riqueza dos nobres modernos. Cite-se como exemplo o nosso Brasil com o caso alegórico do “Deputado do Castelo” Edmar Moreira, surpreendido por não declarar à Receita Federal um “modesto” castelo com piso de mármore, 36 suítes, piscinas, lago e jardins.
Por outro lado, existem aqueles que discernem na política uma forma de contribuição social. Os que pensam dessa forma enxergam no exercício da função pública um bônus, onde a detenção do poder com todos os privilégios que lhe são próprios, junto com a importância histórica e social do cargo, é suficiente para retribuir o trabalho de seu ocupante. Não se trata de fazer alguém trabalhar de graça pelo país, mas de ressaltar o aspecto político do cargo público.
Cite-se como exemplo a Suécia, onde um vereador da capital nacional Estocolmo recebe apenas R$ 350,00 (isso mesmo: trezentos e cinquenta reais) mensais como ajuda de custo, esse valor representa apenas 10% da renda de um assalariado médio sueco, que é de R$ 7,5 mil reais mensais (aplicando essa lógica imagine quanto, teoricamente, deveria receber um deputado se o salário médio do brasileiro, hoje de R$ 1.345,00, fosse o mesmo que o dos suecos).
Já dentre os que pensam dessa segunda forma encontram-se aqueles que relevam a importância social do crédito democrático. Esses fazem da atividade política uma prática que deve ser exercida acompanhada dos princípios constitucionais e democráticos que lhe são inerentes. O sucesso aqui reside na conciliação dos debates políticos com a adequada representação de todas as classes sociais.
Pensando assim, a política não deve remunerar os que dela se ocupam, esses o fazem por escolha pessoal e, sobretudo, por dever cívico. O pagamento de qualquer valor deveria, portanto, ser simbólico e nunca retributivo. É claro que a comparação dos exemplos do Brasil e da Suécia deve ser feita levando-se em consideração toda uma gama de fatores históricos e culturais bem diferentes para ambas as nações, o que não significa que sejamos tão desiguais na forma de vermos a política.
O Brasil, democracia recente que é, vem mostrando aos poucos a sua cara para uma população cada vez mais consciente. Cite-se como exemplo a mobilização da sociedade e da imprensa caruaruense em torno do debate sobre o aumento dos subsídios mencionados acima. Após uma semana de discussões e intensa participação social, o prefeito de Caruaru, José Queiroz, emitiu uma nota informando que iria vetar o aumento aprovado pela Câmara Municipal. Ainda que pareça uma vitória política foi uma verdadeira conquista democrática que contou com a participação de uma sociedade que se mostra menos passiva e mais desperta politicamente.
*Diego Cintra é professor universitário