TRF-5 nega recurso para impedir afundamento de porta-aviões

Lucas Medeiros - 03.02.2023 às 19:05h
(Imagem: Reprodução/ Poder Naval)

O Tribunal Regional Federal da 5ª Região negou, nesta sexta-feira (03), recurso do Ministério Público Federal e manteve a decisão da primeira instância da Justiça Federal em Pernambuco que indeferiu pedido para impedir que o casco do porta-aviões São Paulo seja afundado em águas brasileiras.

A decisão é do desembargador Leonardo Resende Martins. O MPF entrou com o recurso na quinta (02), alegando risco ambiental em caso de afundamento da embarcação.

A Marinha decidiu descartar o casco na costa brasileira, mesmo após um grupo saudita oferecer R$ 30 milhões pelo equipamento.

O desembargador diz, na decisão desta sexta, que deferir o recurso postulado pelo Ministério Público “provavelmente resultaria em inutilidade, dada a iminência de afundamento espontâneo do casco, o que em nada favoreceria o meio ambiente e ainda poderia proporcionar riscos à vida e à incolumidade da tripulação envolvida na operação de reboque atualmente em curso“.

A sucata da embarcação atualmente conta com 9 toneladas de amianto, substância com potencial tóxico e cancerígeno, além de 644 toneladas de tintas e outros materiais perigosos, de acordo com o MPF. O uso do amianto é proibido no Brasil desde 2017, após decisão do Supremo Tribunal Federal

Na decisão, o desembargador afirma que “é indiscutível que o afundamento do casco, de proporções gigantescas e contendo em sua estrutura substâncias tóxicas, é uma solução a se lamentar intensamente“.

O magistrado lembra, no documento, que o navio foi leiloado em 2022 para uma empresa estrangeira, mas a Turquia barrou a entrada da embarcação em seu território. O desembargador disse que, conforme relatório da Marinha, “a atual situação em que se encontra o casco parece não deixar muitas alternativas viáveis“.

A viabilidade de realizar reparos no casco no local onde ele se encontra atualmente também parece improvável, segundo se colhe da avaliação dos especialistas que o periciaram“, acrescentou.

O magistrado do TRF-5 ainda classificou o afundamento como “solução lamentável e trágica”, mas disse que a decisão cabe apenas aos agentes públicos responsáveis. “Pretender substituir os agentes administrativos em avaliação tão especializada é medida de alto risco, que pode comprometer, inclusive, a vida dos tripulantes que, no momento, realizam o serviço de reboque do casco. A delicadíssima situação reclama autocontenção judicial e confiança na responsabilidade decisória das autoridades competentes.

O desembargador Leonardo Resende Martins mencionou ainda a oferta do grupo saudita para adquirir o caso e disse que, se a proposta for viável, tem convicção de que a Marinha, o Ibama e a AGU viabilizariam a venda. “Não se sabe, porém, qual o nível de concretude dessa proposta, se ela efetivamente existe tal como noticiado ou se houve reais tratativas nesse sentido. […] Seria preciso avaliar se ainda haveria tempo hábil para realizar o salvamento do casco, que se deteriora em ritmo cada vez mais acelerado.”

No recurso, a Procuradoria pediu ao TRF-5 que, além de mudar a decisão da Justiça, determinasse à Marinha a imediata suspensão de qualquer serviço voltado ao afundamento da embarcação, em alto-mar ou próximo ao litoral, sem a apresentação de estudos que comprovem a ausência de risco ambiental.

O MPF argumentou que “nota técnica do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) aponta para o risco de danos ambientais graves no caso de eventual afundamento, especialmente levando em consideração que o casco se encontra avariado, conforme inspeções realizadas por orientação da Marinha“. A ação foi motivada pela notícia de que o afundamento da embarcação estava programado para quarta-feira (1º), o que terminou não ocorrendo até o momento.

O porta-aviões São Paulo tem 266 metros de comprimento. Seu armamento era composto de três lançadores duplos de mísseis e metralhadoras de grosso calibre. O amianto era usado como isolante térmico e acústico, para reduzir o barulho da decolagem das aeronaves para a tripulação.

Ao confirmar a decisão de afundar, o Ministério da Defesa disse que, diante da “deterioração das condições de flutuabilidade” e da “inevitabilidade de afundamento espontâneo“, não seria possível adotar outra conduta “que não o alijamento do casco“.

A proposta do grupo saudita pelo caso foi feita na última segunda-feira (30).

Na quarta-feira (1º), o Ministério da Defesa, a Marinha e a AGU (Advocacia-Geral da União) emitiram uma nota conjunta para informar que o trem de reboque do casco “foi direcionado para área marítima mais afastada, dentro das Águas Jurisdicionais Brasileiras (AJB), a 350 km da costa brasileira e com profundidade aproximada de 5 mil metros“.

Inutilizado há décadas, o navio passou por um desmanche na França. Na década de 1990, ele chegou a passar por um processo que retirou 55 toneladas do produto tóxico.

O porta-aviões foi vendido pela Marinha ao estaleiro turco especializado em desmanche de navios. O veículo deixou o Brasil no dia 4 de agosto, em viagem que gerou protestos pelo mundo e foi monitorada em tempo real pelo Greenpeace.

A Marinha diz que, após a decisão de desmobilizar o porta-aviões, optou pela venda do casco para “desmanche verde“, um processo de reciclagem segura para o qual o estaleiro turco Sök é credenciado e certificado.

Mas, diante de denúncias sobre a exportação ilegal de amianto, o governo turco revogou autorização para entrada da embarcação no dia 26 de agosto, quando o navio se aproximava do Estreito de Gilbraltar, em viagem feita com o auxílio de um rebocador.

Análises feitas pela ONG Shipbreaking em um porta-aviões gêmeo ao São Paulo identificou 760 toneladas de amianto na embarcação. Diante disso, a organização passou a questionar se, de fato, o casco enviado pelo Brasil teria as 10 toneladas da substância tóxica como previsto no inventário.

O Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e Recursos Naturais Renováveis (Ibama) suspendeu a licença de exportação e determinou o retorno do navio ao Brasil.