
O Tribunal Regional Federal da 5ª Região negou, nesta sexta-feira (03), recurso do Ministério Público Federal e manteve a decisão da primeira instância da Justiça Federal em Pernambuco que indeferiu pedido para impedir que o casco do porta-aviões São Paulo seja afundado em águas brasileiras.
A decisão é do desembargador Leonardo Resende Martins. O MPF entrou com o recurso na quinta (02), alegando risco ambiental em caso de afundamento da embarcação.
A Marinha decidiu descartar o casco na costa brasileira, mesmo após um grupo saudita oferecer R$ 30 milhões pelo equipamento.
O desembargador diz, na decisão desta sexta, que deferir o recurso postulado pelo Ministério Público “provavelmente resultaria em inutilidade, dada a iminência de afundamento espontâneo do casco, o que em nada favoreceria o meio ambiente e ainda poderia proporcionar riscos à vida e à incolumidade da tripulação envolvida na operação de reboque atualmente em curso“.
A sucata da embarcação atualmente conta com 9 toneladas de amianto, substância com potencial tóxico e cancerígeno, além de 644 toneladas de tintas e outros materiais perigosos, de acordo com o MPF. O uso do amianto é proibido no Brasil desde 2017, após decisão do Supremo Tribunal Federal
Na decisão, o desembargador afirma que “é indiscutível que o afundamento do casco, de proporções gigantescas e contendo em sua estrutura substâncias tóxicas, é uma solução a se lamentar intensamente“.
O magistrado lembra, no documento, que o navio foi leiloado em 2022 para uma empresa estrangeira, mas a Turquia barrou a entrada da embarcação em seu território. O desembargador disse que, conforme relatório da Marinha, “a atual situação em que se encontra o casco parece não deixar muitas alternativas viáveis“.
“A viabilidade de realizar reparos no casco no local onde ele se encontra atualmente também parece improvável, segundo se colhe da avaliação dos especialistas que o periciaram“, acrescentou.
O magistrado do TRF-5 ainda classificou o afundamento como “solução lamentável e trágica”, mas disse que a decisão cabe apenas aos agentes públicos responsáveis. “Pretender substituir os agentes administrativos em avaliação tão especializada é medida de alto risco, que pode comprometer, inclusive, a vida dos tripulantes que, no momento, realizam o serviço de reboque do casco. A delicadíssima situação reclama autocontenção judicial e confiança na responsabilidade decisória das autoridades competentes.“
O desembargador Leonardo Resende Martins mencionou ainda a oferta do grupo saudita para adquirir o caso e disse que, se a proposta for viável, tem convicção de que a Marinha, o Ibama e a AGU viabilizariam a venda. “Não se sabe, porém, qual o nível de concretude dessa proposta, se ela efetivamente existe tal como noticiado ou se houve reais tratativas nesse sentido. […] Seria preciso avaliar se ainda haveria tempo hábil para realizar o salvamento do casco, que se deteriora em ritmo cada vez mais acelerado.”
No recurso, a Procuradoria pediu ao TRF-5 que, além de mudar a decisão da Justiça, determinasse à Marinha a imediata suspensão de qualquer serviço voltado ao afundamento da embarcação, em alto-mar ou próximo ao litoral, sem a apresentação de estudos que comprovem a ausência de risco ambiental.
O MPF argumentou que “nota técnica do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) aponta para o risco de danos ambientais graves no caso de eventual afundamento, especialmente levando em consideração que o casco se encontra avariado, conforme inspeções realizadas por orientação da Marinha“. A ação foi motivada pela notícia de que o afundamento da embarcação estava programado para quarta-feira (1º), o que terminou não ocorrendo até o momento.
O porta-aviões São Paulo tem 266 metros de comprimento. Seu armamento era composto de três lançadores duplos de mísseis e metralhadoras de grosso calibre. O amianto era usado como isolante térmico e acústico, para reduzir o barulho da decolagem das aeronaves para a tripulação.
Ao confirmar a decisão de afundar, o Ministério da Defesa disse que, diante da “deterioração das condições de flutuabilidade” e da “inevitabilidade de afundamento espontâneo“, não seria possível adotar outra conduta “que não o alijamento do casco“.
A proposta do grupo saudita pelo caso foi feita na última segunda-feira (30).
Na quarta-feira (1º), o Ministério da Defesa, a Marinha e a AGU (Advocacia-Geral da União) emitiram uma nota conjunta para informar que o trem de reboque do casco “foi direcionado para área marítima mais afastada, dentro das Águas Jurisdicionais Brasileiras (AJB), a 350 km da costa brasileira e com profundidade aproximada de 5 mil metros“.
Inutilizado há décadas, o navio passou por um desmanche na França. Na década de 1990, ele chegou a passar por um processo que retirou 55 toneladas do produto tóxico.
O porta-aviões foi vendido pela Marinha ao estaleiro turco especializado em desmanche de navios. O veículo deixou o Brasil no dia 4 de agosto, em viagem que gerou protestos pelo mundo e foi monitorada em tempo real pelo Greenpeace.
A Marinha diz que, após a decisão de desmobilizar o porta-aviões, optou pela venda do casco para “desmanche verde“, um processo de reciclagem segura para o qual o estaleiro turco Sök é credenciado e certificado.
Mas, diante de denúncias sobre a exportação ilegal de amianto, o governo turco revogou autorização para entrada da embarcação no dia 26 de agosto, quando o navio se aproximava do Estreito de Gilbraltar, em viagem feita com o auxílio de um rebocador.
Análises feitas pela ONG Shipbreaking em um porta-aviões gêmeo ao São Paulo identificou 760 toneladas de amianto na embarcação. Diante disso, a organização passou a questionar se, de fato, o casco enviado pelo Brasil teria as 10 toneladas da substância tóxica como previsto no inventário.
O Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e Recursos Naturais Renováveis (Ibama) suspendeu a licença de exportação e determinou o retorno do navio ao Brasil.